quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

SOMOS FILHOS AMADOS DE DEUS

Em uma certa altura da sua carta aos gálatas, o apóstolo Paulo destaca dois personagens da história de Israel: Abraão e Moisés. Deus chama Abraão e promete abençoar todas as famílias da terra pelo seu descendente. Esse descendente é Cristo, por meio de quem o Pai está formando uma só família. Depois, Deus dá a Lei a Moisés e o cumprimento da promessa se torna necessário e urgente. Essa Lei condena a todos para que Cristo possa justificar os que crêem no Evangelho. Logo, o que o apóstolo está ensinando é o seguinte: todos aqueles que foram condenados pela Lei de Moisés e justificados pela fé em Cristo são herdeiros da promessa que Deus fez a Abraão e fazem parte da família que o Pai está formando. Eles deixaram de ser escravos e se tornaram filhos. Gálatas 3:26 a 4:7 apresenta três preciosas verdades sobre a nossa filiação.

 

Somos filhos de Deus Pai

 

O Pai sempre desejou formar uma família de muitos filhos e filhas. Assim, Paulo começa dizendo: “Todos vocês são filhos de Deus mediante a fé em Cristo Jesus” (3:26). Ou seja, os gálatas se tornaram filhos de Deus quando ouviram e creram no Evangelho. Eles nasceram de novo e colocaram a sua confiança na pessoa e na obra de Cristo. O sinal visível deste novo nascimento invisível é o batismo. De acordo com o apóstolo, quem crê no Evangelho e é batizado passa a pertencer à família de Deus. Nessa família, cujas relações são igualitárias, há unidade em meio à diversidade. Nela, Paulo afirma: “Não há judeu nem grego” – não há mais barreiras raciais e culturais – “escravo nem livre” – não há mais barreiras sociais e econômicas – “homem nem mulher” – não há mais barreiras de sexo ou de gênero – “pois todos são um em Cristo Jesus.” (3:28). E todos, indistintamente, são descendentes de Abraão e herdeiros da promessa de uma só família, livre e abençoada por Deus.

O apóstolo nos ensina que são filhos e filhas de Deus aqueles e aquelas que colocam a sua confiança na pessoa e na obra de Cristo. Essas pessoas dão testemunho público da sua fé por meio do batismo. Elas passam a fazer parte da família de Deus. A beleza dessa família se expressa pela unidade em meio à diversidade, nunca pela uniformidade. Como na família de Deus as relações são igualitárias, os filhos e as filhas de Deus são os primeiros a se levantar contra as relações marcadas por superioridade e inferioridade, por dominação e subjugação. São os primeiros a se levantar contra o racismo, a opressão, o machismo, etc.. São os primeiros a se levantar contra estes e outros pecados estruturais.

 

Somos redimidos por Deus Filho

 

O texto segue e Paulo estabelece uma relação entre um herdeiro, menor de idade, e um escravo. O herdeiro, menor de idade, está sujeito a guardiães e administradores. O escravo está sujeito ao senhor. Assim sendo, ambos são, de certa forma, escravos. O apóstolo continua a sua argumentação dizendo que os gálatas eram como esse herdeiro, menor de idade, sujeitos aos princípios elementares do mundo. Mas o que são os princípios elementares do mundo? Os melhores comentaristas acham que é a Lei, instrumentalizada pelo Diabo, para tiranizar. Sobre isso, John Stott afirma: “Deus pretendia que a lei revelasse o pecado e levasse os homens a Cristo; Satanás usou-a para revelar o pecado e levar os homens aos desespero.”. Timothy Keller acrescenta algo muito interessante: “Em certo sentido, todos nos encontramos ‘debaixo da lei’, mesmo que nunca tenhamos ouvido falar da Bíblia ou de Moisés. Por quê? Porque todos tentamos desesperadamente viver à altura de determinados padrões. Somos ansiosos e vivemos sobrecarregados pelas preocupações.”. “Mas”, diz Paulo, “quando chegou a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido debaixo da Lei, a fim de redimir os que estavam sob a Lei, para que recebêssemos a adoção de filhos.” (4:4). Os judeus, ouvindo essas palavras, lembrariam da Páscoa e do êxodo. Jesus, o Filho de Deus, é o redentor, aquele que realiza um novo êxodo. Sobre este verso, Stott comenta: “Se ele [Jesus] não fosse homem, não poderia ter remido os homens. Se não fosse justo, não poderia ter remido os injustos. E, se não fosse o Filho de Deus, não poderia ter remido as pessoas para Deus, tornando-as filhas de Deus.”. Pergunta: como alguém se torna filho ou filha de Deus? O Pai adota todos aqueles que o Filho redime. Jesus é o Filho gerado do Pai e todos aqueles que nele crêem tornam-se filhos adotados do Pai.

Por tudo isso, é muito importante que compreendamos o papel da Lei. Como diz o meu amigo Ariovaldo Ramos, “ela nos coloca de joelhos para que a graça nos coloque de pé”. É a lei que nos conduz a Cristo, o nosso redentor. Agora, sem a obrigação de cumprir a Lei ou de viver à altura de determinados padrões para sermos aceitos na família de Deus (escravidão), crescemos em obediência amorosa, consciente e responsável (liberdade).

 

Somos habitados por Deus Espírito Santo

 

Tendo afirmado que o Pai enviou o Filho, Paulo diz que ele enviou também o Espírito Santo: “E, porque vocês são filhos, Deus enviou o Espírito de seu Filho ao coração de vocês, e ele clama: ‘Aba, Pai’.” (4:6). Os judeus, ouvindo também essas palavras, lembrariam da aliança no Sinai e do Pentecostes. O Espírito Santo, que habita o coração dos que crêem, é aquele que sela a nova aliança. É por meio dele que aqueles que crêem podem clamar “Aba, Pai”. “Aba” é o diminutivo aramaico de “Pai”, é “Papaizinho”. Foi assim que Jesus se referiu a Deus e nos ensinou a fazer o mesmo. Então, chamar Deus de “Papaizinho” implica tanto identidade, somos filhos, quanto intimidade, ele está sempre conosco. Por fim, o apóstolo conclui com as seguintes palavras: “Assim, você já não é mais escravo, mas filho; e, por ser filho, Deus também o tornou herdeiro.” (4:7). Do início ao fim, a ênfase do texto é a mesma: a filiação. Em Cristo, aqueles que crêem deixam de ser escravos e tornam-se filhos. Mais do que isso, tornam-se herdeiros da promessa de uma só família, livre e abençoada por Deus.

Por fim, o Espírito Santo é a maior bênção que recebemos do Pai. Ele nos possibilita uma comunhão íntima com a Trindade. Todos nós que temos o Espírito Santo temos também a certeza de que somos filhos de Deus Pai e herdeiros com Deus Filho. Esta é uma experiência profundamente pessoal e com belíssimas implicações comunitárias. E é pelo poder do Espírito brota em nós o seu fruto. Isso desde que nos submetamos a ele, não criemos resistência à sua ação em nós. Portanto, somos filhos do Pai, redimidos pelo Filho e habitados pelo Espírito Santo. A minha oração é que Deus nos ajude a ser família, a viver de modo digno como seus filhos e filhas. Que assim seja!

 

Luiz Felipe Xavier.