O Evangelho de Marcos nos apresenta
uma série de quatro milagres sobre “ouvir” e “ver”. O primeiro é a cura de um
surdo e gago; o segundo é a cura de um cego em duas etapas – diga-se de
passagem, o único milagre nos Evangelhos que acontece em etapas; o terceiro é a
cura de um endemoninhado surdo e mudo; e o quarto é a cura do cego Bartimeu. Como
todo texto bíblico, a narrativa da cura do cego em duas etapas (8:22-26) precisa
ser lida à luz do seu contexto imediatamente anterior, que trata da cegueira
dos discípulos de Jesus (8:14-21). Embora estes já vejam mais do que os líderes
religiosos de Israel, eles ainda não vêem tudo claramente. Logo, a narrativa da
cura do cego em duas etapas pode ser lida a partir do fato em si, a restauração
física, e a partir do que o fato simboliza, a restauração espiritual. Isso
porque Jesus é o Messias que restaura
tanto a visão física quanto a visão espiritual. Tomando como referência essa
narrativa, constatamos que o processo de restauração dessas visões se dá em
três etapas.
A
primeira etapa é a da cegueira total. Marcos
diz que Jesus e os discípulos vão para Betsaida, uma aldeia de pescadores na margem norte do Lago da Galiléia, a
leste da foz do Jordão. Ali, algumas pessoas levam um homem cego e pedem a
Jesus que o toque. Esse homem é alguém que se sente amaldiçoado por Deus e
excluído da vida religiosa. Mas Jesus o toma pela mão e o leva para fora do
povoado. Aqui, chama a atenção o fato de que a condição inicial desse homem simboliza
a condição inicial dos discípulos: cegueira total. O que os discípulos não viam?
Eles não viam que Jesus acolhe pecadores por graça, não por méritos. Marcos
deixa claro que Jesus acolhe graciosamente os “amaldiçoados” e excluídos da
vida religiosa e nos chama a fazer o mesmo. Como igreja de Jesus, precisamos estar
de braços abertos. Mais do que isso, precisamos dar o braço e caminhar com
aqueles “amaldiçoados” e excluídos que nos são trazidos.
A
segunda etapa é a da visão parcial.
Fora do povoado, Jesus cospe nos olhos do homem cego e lhe impõe as mãos. Depois
de fazer isso, Jesus lhe pergunta: “Você está vendo alguma coisa?”. O homem
levanta os olhos e diz: “Vejo pessoas; elas parecem árvores andando.”. Sua visão
ainda está turva. Agora, porém, ele deixa a condição de cegueira total e entra
na condição de visão parcial. Aqui, chama a atenção o fato de que a condição
intermediária do homem simboliza a condição atual dos discípulos: visão
parcial. O que os discípulos vêem parcialmente? Embora já vejam a graça de
Jesus, eles ainda não conseguem ver os efeitos danosos da hipocrisia religiosa
dos seus dias. No contexto imediatamente anterior, essa hipocrisia é ilustrada
pelo chamado “fermento dos fariseus”. Marcos deixa claro também que Jesus se
compadece dos que sofrem e nos chama a fazer o mesmo. Nós nos compadecemos dos
que sofrem quando o seu sofrimento nos afeta e nos leva à ação em seu favor.
A
terceira e última etapa é a da visão total. Mais uma vez, Jesus coloca as mãos sobre os olhos do
homem. Desta vez, seus olhos são abertos totalmente. O milagre se consuma, sua
vista é restaurada e ele vê tudo claramente. O que está acontecendo aqui é o
cumprimento das profecias messiânicas. Tomemos como exemplo a profecia de
Isaías 42:6-7,16: “Eu, o Senhor, o chamei para a justiça; segurarei firme a sua
mão. Eu o guardarei e farei de você um mediador para o povo e uma luz para os
gentios, para abrir os olhos aos cegos, para libertar da prisão os cativos e
para livrar do calabouço os que habitam na escuridão. (...) Conduzirei os cegos
por caminhos que eles não conheceram, por veredas desconhecidas eu os guiarei;
transformarei as trevas em luz diante deles e tornarei retos os lugares
acidentados.”. O tão esperado Messias dos judeus e dos gentios chegou! A prova
disso é que os cegos estão vendo. Jesus cura o homem cego e o manda para casa,
dizendo: “Não entre no povoado!”. Aqui, chama a atenção o fato de que a
condição final do homem simboliza a condição final que Jesus espera dos
discípulos: visão total. O que os discípulos precisam ver totalmente? Eles
precisam ver que Jesus é o Messias tanto dos judeus quanto dos gentios. Marcos
deixa claro ainda que Jesus restaura completamente os desafortunados e nos
chama a fazer o mesmo. Para a glória do Pai, em nome de Jesus e no poder do Espírito
Santo, nós podemos ser instrumentos de transformação de vidas e de realidades. Para
tal, faremos bem em começar com as pequenas demandas que nos são trazidas. De uma
coisa podemos ter certeza: uma vez que Jesus entrou na História, não há
história que não possa ser transformada por ele.
Que Deus, por sua graça, nos ajude a
ver claramente!
Luiz Felipe Xavier.
Luiz, muito obrigada por essa reflexão. Sem dúvida, fui edificada agora. Deus continue usando sua vida. Abraço!
ResponderExcluirLuiz, muito obrigada por essa reflexão. Sem dúvida, fui edificada agora. Deus continue usando sua vida. Abraço!
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