O livro de Levítico, “Chamou o Senhor”, pode
ser dividido em dois grandes blocos. No primeiro, “Chamou o Senhor” à comunhão
com ele (1-17). Esse bloco trata das leis sobre as ofertas (1-7), das leis
sobre o sacerdócio (8-10), das leis sobre a pureza (11-15) e das leis sobre a
expiação (16-17). No segundo bloco, “Chamou o Senhor” a uma vida santa (18-27).
Esse trata das leis pessoais (18-20); das leis sacerdotais (21-22); das leis
festivais (23-24); e das leis econômico-sociais (25-27). Logo, Levítico 25,
texto sobre o ano sabático e o ano do jubileu, está inserido no contexto das
leis econômico-sociais. À luz desse
texto, fica evidente que Deus chama o seu povo a uma vida santa e, para tal,
estabelece leis econômico-sociais que devem ser obedecidas. Dessas leis pode-se
extrair 3 importantes princípios.
O primeiro
princípio é o da mordomia da criação (1-7).
“Diga
o seguinte aos israelitas: Quando vocês entrarem na terra que lhes dou, a própria
terra guardará um sábado para o SENHOR.” (v. 2). Neste contexto, o sábado é um
ano de descanso para a terra (Cf. v. 4,5,6). Assim como Deus trabalhou seis
dias e descansou no sétimo, o ser humano deve trabalhar seis dias e descansar
no sétimo, e a terra deve trabalhar seis anos e descansar no sétimo. No ano
sabático, não se semeia e não se colhe. Durante este sétimo ano, o povo é
sustentado pelo produto espontâneo da terra (Cf. v. 6,7) e pelo que resta da
produção do sexto ano (Cf. v. 20-22). Do princípio da mordomia da criação é
possível aprender sobre a confiabilidade do Provedor, a contenção da ganância e
o contentamento do sustentado.
O segundo
princípio e o da equidade entre todos (8-24).
“Contem
sete semanas de anos, sete vezes sete anos; essas sete semanas de anos
totalizam quarenta e nove anos. Então façam soar a trombeta no décimo dia do
sétimo mês; no Dia da Expiação façam soar a trombeta por toda a terra de vocês.
Consagrem o quinquagésimo ano e proclamem libertação por toda a terra a todos
os seus moradores. Este lhes será um ano de jubileu, quando cada um de vocês
voltará para a propriedade da sua família e para o seu próprio clã.” (v. 8-10).
Neste contexto, o jubileu é um ano de libertação. As dívidas são canceladas, as
terras são redistribuídas, os escravos são libertados e a unidade familiar é
restabelecida. Vale ressaltar que o ano do jubileu é também um ano sabático. A
diferença é que no ano do jubileu cada um tem o direito de voltar à sua propriedade.
Nele acontece “reforma agrária”. É interessante perceber que há uma relação
direta entre o Dia da Expiação e a libertação econômica. Isso significa que
quando o pecado, que gera a injustiça social, é perdoado, a consequência é
justiça social.
O ano do jubileu é necessário porque nos anos
que o antecedem há concentração de terra. Mas a terra não pode ser concentrada por
três razões. A primeira é porque a ela pertence a Deus. “A terra não poderá ser
vendida definitivamente, porque ela é minha (...).” (v. 23a). Se ela pertence a
Deus, ela não pertence a ninguém do povo. A segunda razão é porque o povo é
apenas estrangeiro e imigrante na terra. “(...) e vocês são apenas estrangeiros
e imigrantes.” (v. 23b). Se o povo é estrangeiro e imigrante, a terra é apenas
meio de produção para seu sustento. A terceira razão é porque a terra é
concentrada através da exploração do próximo. “Se vocês venderem alguma
propriedade ao seu próximo ou se comprarem alguma propriedade dele, não
explorem o seu irmão. (...) Não explorem um ao outro, mas temam o Deus de
vocês. Eu sou o Senhor, o Deus de vocês.” (v. 14,17). Do princípio da equidade
entre todos é possível aprender sobre a condenação da exploração, a contradição
da acumulação e a concretização da justiça.
O terceiro
princípio e o da solidariedade aos pobres (25-55). Neste
bloco final de Levítico 25, por três vezes aparece a expressão: “Se algum do
seu povo empobrecer (...)”. A primeira vez que aparece é: “Se alguém do seu
povo empobrecer e vender parte da sua propriedade (...).” (v. 25). O que deve
acontecer? O parente mais próximo resgata a propriedade. Se isso não for
possível, a própria pessoa trabalha e resgata sua propriedade. Se isso não for
possível, no ano do jubileu ela resgata a sua propriedade. É digno de nota que,
no texto, ainda há leis específicas sobre a venda de casas: nas cidades
muradas, nos povoados e nas cidades dos levitas. Em todas essas leis, o direito
de resgate da propriedade é garantido. A segunda vez que aparece a expressão
“Se algum do povo empobrecer (...)” é: “Se alguém do seu povo empobrecer e não
puder sustentar-se (...)”. (v. 35). O que deve acontecer? O povo deve ajudar,
como se faz ao estrangeiro e ao residente temporário. Nesta ajuda, não se pode
cobrar juro. Nesta ajuda, não se pode emprestar mantimento visando lucro. Aqui se
encontra um detalhe importante: toda esta solidariedade é por temor ao Senhor e
para a garantia da vida do empobrecido na terra. A terceira vez que aparece a
expressão “Se algum do povo empobrecer (...)” é: “Se alguém do seu povo
empobrecer e vender a algum de vocês (...)”. (v. 39). O que deve acontecer? Considerem-no
como um trabalhador contratado ou como um residente temporário, não como um
escravo. Deem-lhe condições de trabalhar e libertem-no no ano do jubileu. Aqui se
encontra mais um detalhe importante: o tratamento digno, não impiedoso, é por
temor ao Senhor. Por fim, do princípio da solidariedade aos pobres, é possível
aprender sobre a cooperação familiar, a colaboração desinteressada e as condições
trabalhistas.
Que neste mundo marcado por crise econômico
social, todos nós possamos considerar os princípios da mordomia da criação, da
equidade entre todos e da solidariedade aos pobres!
Luiz Felipe Xavier.